Voltando ao escândalo dos subsídios dos ‘boys’

A ‘justificação’ governamental sobre subsídios pagos em 2012 aos nomeados para funções públicas em 2011, alinha pelas velhas ‘calinadas nacionais’ que, em idos tempos de sossego, nos entretinham e divertiam. Hoje, as palavras, os conceitos e os privilégios são pesados ao milímetro, ofendem e geram revolta. O Governo não percebeu isto e continua a brincar com conceitos, a desencadear batalhas semânticas, a fabricar toneladas de retórica balofa e contrafeita. link

Primeiro, Passos Coelho mostrou-se indignado com a designação de ‘boy’s’, atribuída aos ‘seus’ nomeados políticos. Este senhor tenta passar pela imaginária situação de nunca ter usado esta terminologia política e a sua preocupação é apagar tudo o que disse quando o seu partido estava na oposição. Deverá estar por aí a chegar uma proposta de ‘refundação’ do conceito de boy’s e suas funções.

Depois, trata com um saloio preconceito o universo de tudo aquilo que pode ser considerado como ‘função pública’. Os nomeados políticos oriundos do sector privado (a base de recrutamento para ocupar os cargos públicos de nomeação política) chegaram às actuais funções carregados de direitos adquiridos. Numa palavra blindados. Trata-se de uma horda de ‘neocons’ apostados em destruir o Estado e incentivar a ‘alavancagem’ de negócios especulativos no domínio público, em tudo idênticos aos que nos lançaram na presente crise.

Este Governo tem por (oculta) missão criar uma profunda divisão entre trabalhadores públicos e privados, ignorando os trágicos riscos de destruição da coesão social e a total perversão dos conceitos de justiça e de equidade onde se alicerçam as sociedades da era contemporânea. De facto, a clivagem entre o sector público e privado – separando os funcionários dos trabalhadores - é uma irresponsável manobra de diversão de dividir para reinar já que, como todos temos a noção, nada de sólido poderá existir sem uma interpenetração cooperante (sinérgica) e, por fim, o sector público para cumprir (bem) as funções que, constitucionalmente, lhe estão acometidas – entre elas a Educação, Sáude, Segurança social e as de Soberania - necessita de ‘estímulos’ (motivação). 
As comparações, a existirem, só poderão ter uma incidência sectorial e específica colocando, lado a lado, o que é comparável. Generalizações e globalizações conduzem inevitavelmente à asneira e a única coisa que asseguram é a demagogia. Na verdade, o sector privado padece de uma incontornável e oculta maleita: não consegue (ou não quer) pagar salários em linha com os países europeus (ajustados ao nosso PIB). E aí é que está o busílis. Ou, para usar um jargão político corrente, uma área a ‘ajustar’.

Ora é exactamente sobre os modelos de recrutamento e de retribuição que as relatadas inconformidades e discriminações relativas aos ‘arrivistas’ (para não chamar ‘boy's’), de nomeação política, acusados de estarem em situação de privilégio, acabam por colocar em causa a equidade de tratamento dos cidadãos e expor os protagonistas de tal dislate à crítica, neste caso, inevitavelmente, pública.

Senão vejamos: Um aposentado que, p. exº., trabalhou dezenas de anos na FP e tinha direito aos seus subsídios (que integravam a remuneração acordada), perdeu-os e o facto de os ter consuetudinariamente adquirido e, portanto, estarem implícita ou tacitamente contratualizados, não conta nas espúrias justificações que o 1º. Ministro se apressou a vir a terreiro apresentar.

Pior ainda estará um pensionista. Este é oriundo do sector privado onde, em 2012, (ainda) não existiram cortes de subsídios e é apanhado nesta onda de só porque a Caixa Nacional de Pensões é administrada pelo Estado e o seu vencimento está à mão de semear. Um pensionista tem igualmente subsídios de férias vencidos em 2011 e para chegar à execução orçamental e ao esbulho fiscal de 2012, passou necessariamente pelo Natal…

Enfim, um Governo sem vergonha e que para cada problema que tem de enfrentar arranja uma nova trapalhada. Como o povo diz: ‘cada cavadela, sua minhoca’.
Passos Coelho, cada dia que passa continuando a exercer funções governativas, identifica-se, aos olhos dos portugueses, com um vulgar ‘vendedor de banha da cobra’…

Comentários

Inteiramente de acordo.
Só quero acrescentar uma achega. Diz-se no post que os pensionistas são apanhados no esbulho "só porque a Caixa Nacional de Pensões é administrada pelo Estado e o seu vencimento está à mão de semear."
A coisa é pior : A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores não é administrada pelo Estado, que não contribui para ela com um cêntimo que seja nem garante as pensões; é financiada apenas pelas contribuições dos associados e por doações - designadamente testamentárias - destes. Pois mesmo assim a quadrilha quis deitar a mão aos seus subsídios de férias e Natal de 2012. Como esses subsídios não estão "à mão de semear", notificaram a direção da Caixa para lhe entregar o montante desses subsídios, ameaçando os diretores da Caixa que ficavam pessoalmente responsáveis por tais montantes.
Assim, os associados não receberam o subsídio de férias, cujo montante foi depositado cautelarmente numa conta específica, até ser resolvida a ação judicial que a Caixa pôs contra o Estado pela manifesta ilegalidade do confisco (ação essa que ainda está por decidir.)
Agora, na proposta de orçamento de 2012, e "por via das dúvidas", no artigo referente à chamada "contribuição extraordinária de solidariedade", Gaspar já teve o cuidado de mencionar expressamente a referida Caixa,para obrigar os seus associados a ser "extraordinariamente solidários" (com quem?!).
AHP:

Este comentário merecia ser post a denunciar a situação abominável.

Eu julgava que já nada me surpreenderia. E fui surpreendido.

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