Cavaco: uma personalidade excêntrica…

Aníbal Cavaco Silva entregou o processo de candidatura à Presidência da República no Tribunal Constitucional. Aproveitou o ensejo para afirmar que não atacaria os outros candidatos mas, entretanto, foi adiantando que: "As pessoas às vezes não olham a meios..."

Confrontado pelos jornalistas com a questão da ficha que preencheu na PIDE [conforme revelou a revista Sábado] ateve-se a pormenores laterais.
Primeiro, não se lembrava [questão de memória, não relevante]. Depois, admitiu [condicionalmente] a eventualidade de o ter feito ["se" o fez...], acrescentou, foi por motivos académicos [pormenores que expeditamente se recordou] … Este "se" face aos documentos revelados é uma excentricidade.

O preenchimento de inquéritos [pidescos] foi um dos métodos intimidatórios da polícia política salazarista, bem como a célebre declaração obrigatória para os funcionários públicos. Não é isso que está em causa.
O caso do inquérito da PIDE, reveste-se de importância, não por o candidato ter assinado uma declaração tipo minuta [compulsiva] em que os candidatos a funcionários públicos eram compungidos a “manifestar” [perante um texto modelo previamente impresso] um activo repúdio do comunismo e de todas as ideias subversivas, o que muita gente fez, independentemente da intenção de cumprir, mas pelo facto de o actual candidato à PR ter declarado, de livre vontade e pelo seu próprio punho, estar “integrado no actual regime" [salazarista]. Devemos conceder em abono da inteligência que seria possível arranjar outro tipo de resposta, defensiva como toda a gente fazia, que não fosse tão comprometedora…
Por outro lado, a informação complementar em que declara – “não exerço qualquer actividade política” – era uma banalidade na época. Ninguém [num regime ditatorial] revela actividades desse tipo, quer as tivesse ou não.

O culto de uma ambiguidade retorcida bem como uma incontrolável tentação de deriva para fantasiosos tabus, levou-o a declarar, voluntariamente, a integração no regime do Estado Novo, o que significa, como realmente está [manu]escrito, ser um percalço acidental, a manifestação de uma descuidada inexperiência ou uma mera constatação.
Mas é a informação adicional, voluntária e expressa de forma excedentária: “O sogro casou em segundas núpcias com Maria Mendes Vieira, com quem reside e com quem o declarante não priva”, que é inexplicável. Esta é uma informação tóxica. Enquanto não for esclarecida permanecerão no ar imensas dúvidas: desde a mais grave [uma insidiosa delação para preservar um currículo pessoal “limpo”], a uma [igualmente reprovável] devassa oficiosa de problemas pessoais [familiares].

Na verdade, o declarante entrou aqui em litígio com uma outra vertente da sua personalidade – a moralista – e, neste caso, usou inadequados meios para atingir os fins [ao que supomos académicos].

É, isso, "as pessoas às vezes não olham a meios"e acusam "outros" desse pecadilho.

Comentários

Maria RHenriques disse…
Já eu acho-o mais uma personagem concêntrica ;)

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