Kosovo, 24 de Abril de 1987. O início e o fim da Jugoslávia

Fonte do Mapa: Wikipedia Commons

Data: 24 de Abril de 1987.

Cenário: Kosovo Polje, local onde se travou a batalha de Kosovo Polje de 1389, em que o exército Sérvio foi aniquilado pelo exército Otomano, batalha essa a razão da natureza sagrada do Kosovo para os Sérvios.

Protagonista: Slobodan Milosevic, até então político de segunda linha da nomenklatura do Partido Comunista Sérvio.

Enredo: Utilizando um grupo de agitadores sérvios e montenegrinos, provoca confrontos com a polícia local. Slobodan Milosevic, graças a esta manobra subversiva, entra para a ribalta política da Sérvia. A autonomia da então região autónoma é revogada, os líderes locais albanófonos (especialmente Azem Vllasi) substituídos por sérvios, a Universidade de Pristina, a única a ensinar em Albanês em toda a Jugoslávia (língua falada por 9% da população de toda a federação) é encerrada. A população albanófona é reprimida.
Em seguida, Milosevic provoca, em 1989, através de manobras subversivas e emprego de agitadores, a queda do governo da República do Montenegro, impondo um seu prócere, Momir Bulatovic.
Esta medida foi muito mal acolhida noutras repúblicas da federação, nomeadamente na Eslovénia, onde se preparavam as primeiras eleições multi-partidárias na Jugoslávia, e onde a imprensa era já relativamente livre e pluralista. A Eslovénia protesta contra a supressão do estatuto e a repressão no Kosovo. Começam a abrir-se brechas na Liga dos Comunistas da Jugoslávia, e no seu XIV congresso em Janeiro de 1990 o edifício entra em colapso. Neste congresso, a Sérvia tentara impor uma reforma constitucional baseada em três pontos: 1) redução da autonomia das repúblicas, representação a nível federal baseada no princípio da proporcionalidade e não da qualidade de república ou província autónoma (o que beneficiaria os sérvios, etnia maioritária na federação); 2) eliminação das forças armadas de cada república e consequente incorporação no exército federal (JNA) e 3) competência exclusiva da Sérvia na administração do Kosovo e da Vojvodina. Tais condições foram inaceitáveis para as delegações da Eslovénia e da Croácia, que já tinham organizado eleições democráticas, que temiam a mão de ferro autoritária à la Milosevic, e que procuravam manter a federação tal como ela era. O consenso foi impossível, e a delegação eslovena abandona o congresso. Em Março de 1990 o exército federal propõe à presidência colectiva da Jugoslávia a prerrogativa de poder declarar o estado de emergência em toda a federação e assumir o seu controle em caso de necessidade. Na votação, o resultado é um empate: A Sérvia e os seus caciques (Montenegro, Kosovo e Vojvodina) votam a favor; Eslovénia, Croácia, Macedónia e Bósnia e Herzegovina votam contra. Este empate sela definitivamente o fim de uma Jugoslávia no impasse. Regressando a casa, os vários líderes começam a preparar-se. A Eslovénia altera a sua constituição no sentido de ter competência exclusiva para declarar o estado de emergência, e começa a reforçar as suas forças armadas (Teritorialna obramba). A Croácia segue o mesmo caminho.
A 25 de Junho de 1991, a Eslovénia declara a independência, outras repúblicas seguirão o seu caminho. A 26 de Junho de 1991 o exército federal Jugoslavo invade a Eslovénia, sendo derrotado pelas ligeiríssimas forças armadas eslovenas, na "Guerra dos 10 dias). Assim começa um ciclo de guerra e secessão, que culminará em 2008, com a anunciada secessão do Kosovo.

Este foi um drama em que não há verdades absolutas, em que se confrontaram interesses e nacionalismos. Muitos sugerem que a queda da Jugoslávia foi precipitada por interesses estrangeiros (ainda por identificar), muitos sustentam que as causas e a forma como decorreu a sua queda se devem principalmente aos povos jugoslavos. Eu pessoalmente sigo a segunda corrente de opinião.

Arrumada a questão da secessão do Kosovo, que para bem ou para mal, é um facto cunsumado e resistir-lhe é inútil e contraproducente, os povos dos Balcãs Ocidentais têm que olhar para o futuro, proceder a uma catárse e a uma contrição. Por outro lado, no interesse da paz e da prosperidade desta região, a União Europeia não pode alijar as suas responsabilidades relativamente à paz na Europa, e realizar, num espaço temporal o mais curto possível, o alargamento a todos os países dos Balcãs Ocidentais. Só assim se conseguirá paz duradoura e prosperidade. Isolando esses países só poderá ser contraproducente.

Comentários

e-pá! disse…
Interessante e pedagógico post sobre a situação na ex-Jugoslávia.

Em minha opinião, assitimos à 2ª. "balcanização" dos Balcãs (passe a redundância).
E, por detrás, há sempre um "czar".
Anónimo disse…
Esquece o que está para trás, por isso não explica nada.
Rui Cascao disse…
Obviamente que há muito (como sempre) por trás, como bem referiu o leitor. E obviamente que a má memória da Ustaca croata terá ajudado a aquecer as coisas. Contudo a história também dá argumentos ao outro lado, especificamente a ditadura sérvia do Rei Alexandre sobre toda a Jugoslávia desde 1929, que precipitou os eventos que levaram à desagregação da primeira Jugoslávia em benefício das potências do eixo.
andrepereira disse…
E se depois da secessão do Kosovo, a República Srbska também quiser a secessão da Federação Bósnia-Herzegovina? Ou a união à Sérvia?

Mensagens populares deste blogue

Divagando sobre barretes e 'experiências'…

26 de agosto – efemérides