Carta-resposta a um pároco
Senhor padre Renato Poças
Agradeço a carta que enviou à Associação Ateísta Portuguesa (AAP) e que me mereceu a melhor atenção. Procurarei responder-lhe às perguntas que faz.
Pergunta o Sr. Padre em que é que o ato do PR (beija-mão ao Papa) nos [a nós, ateus] pode ter ofendido. A ofensa não foi feita aos ateus, mas ao carácter laico do Estado que representa e à separação da Igreja e do Estado que a Constituição da República exige.
- Se o Sr. Prof. Marcelo Rebelo de Sousa fizesse uma viagem privada, à sua custa, e não em representação do Estado, onde é o PR dos crentes, descrentes e indiferentes, tinha o direito de se prostrar perante quem considera o representante do deus do Sr. Padre e dele, não o de se colocar numa posição de inferioridade perante outro chefe de Estado, como se Portugal fosse um protetorado do Vaticano. (O beija-mão é um ato medieval de reverência do inferior para com o superior).
Pergunta a seguir: «… é possível um cidadão NEUTRALIZAR a sua identidade religiosa, sexual, cultural, politica, ideológica simplesmente porque assumiu uma função representativa de um povo?»
- Não se trata de neutralizar, trata-se de ser neutral, por obrigação constitucional e por respeito aos cidadãos que têm um deus diferente ou nenhum.
Diz que «Não pode ser exigido a um cidadão que a partir da tomada de posse como presidente passe a ser assexuado, a-religioso, apolítico, apartidário, etc.
- Quanto à sexualidade e à religião, são assuntos do foro íntimo do PR, não tendo de responder ou perguntar sobre os hábitos, frequência ou gostos. Já quanto ao carácter apartidário é desejável que o mantenha e, quanto à posição política, é obrigado a pautá-lo pela CRP.
Finalmente, apesar de respondidas as dúvidas que levanta, permita-me que lhe recorde a tragédia que tem sido para ateus, agnósticos, crentes de outras religiões e hereges a inexistência de laicidade nos países islâmicos, onde a supremacia da crença autóctone legitima a perseguição e o assassínio de todos os outros, tendo os cristãos sido vítimas, atitude que a Associação Ateísta Portuguesa (AAP) tem defendido por pensar que a liberdade religiosa é tão legítima como a do ateísmo e que um Estado confessional é tão perverso quanto um Estado ateu.
Dado que a Igreja católica demorou dois milénios a reconhecer a liberdade religiosa (admitida pelo Concílio Vaticano II, pela primeira vez, no início da década de sessenta do século passado), é legítimo que, para defesa comum, se junte agora aos ateus para reivindicar o carácter laico do Estado e exigir aos seus representantes o respeito pela separação da Igreja e do Estado.
Apresento-lhe, senhor padre, os meus cumprimentos republicanos, laicos e democráticos.
Carlos Esperança
Apostila: A carta do pároco está publicada em comentário as este post.
Agradeço a carta que enviou à Associação Ateísta Portuguesa (AAP) e que me mereceu a melhor atenção. Procurarei responder-lhe às perguntas que faz.
Pergunta o Sr. Padre em que é que o ato do PR (beija-mão ao Papa) nos [a nós, ateus] pode ter ofendido. A ofensa não foi feita aos ateus, mas ao carácter laico do Estado que representa e à separação da Igreja e do Estado que a Constituição da República exige.
- Se o Sr. Prof. Marcelo Rebelo de Sousa fizesse uma viagem privada, à sua custa, e não em representação do Estado, onde é o PR dos crentes, descrentes e indiferentes, tinha o direito de se prostrar perante quem considera o representante do deus do Sr. Padre e dele, não o de se colocar numa posição de inferioridade perante outro chefe de Estado, como se Portugal fosse um protetorado do Vaticano. (O beija-mão é um ato medieval de reverência do inferior para com o superior).
Pergunta a seguir: «… é possível um cidadão NEUTRALIZAR a sua identidade religiosa, sexual, cultural, politica, ideológica simplesmente porque assumiu uma função representativa de um povo?»
- Não se trata de neutralizar, trata-se de ser neutral, por obrigação constitucional e por respeito aos cidadãos que têm um deus diferente ou nenhum.
Diz que «Não pode ser exigido a um cidadão que a partir da tomada de posse como presidente passe a ser assexuado, a-religioso, apolítico, apartidário, etc.
- Quanto à sexualidade e à religião, são assuntos do foro íntimo do PR, não tendo de responder ou perguntar sobre os hábitos, frequência ou gostos. Já quanto ao carácter apartidário é desejável que o mantenha e, quanto à posição política, é obrigado a pautá-lo pela CRP.
Finalmente, apesar de respondidas as dúvidas que levanta, permita-me que lhe recorde a tragédia que tem sido para ateus, agnósticos, crentes de outras religiões e hereges a inexistência de laicidade nos países islâmicos, onde a supremacia da crença autóctone legitima a perseguição e o assassínio de todos os outros, tendo os cristãos sido vítimas, atitude que a Associação Ateísta Portuguesa (AAP) tem defendido por pensar que a liberdade religiosa é tão legítima como a do ateísmo e que um Estado confessional é tão perverso quanto um Estado ateu.
Dado que a Igreja católica demorou dois milénios a reconhecer a liberdade religiosa (admitida pelo Concílio Vaticano II, pela primeira vez, no início da década de sessenta do século passado), é legítimo que, para defesa comum, se junte agora aos ateus para reivindicar o carácter laico do Estado e exigir aos seus representantes o respeito pela separação da Igreja e do Estado.
Apresento-lhe, senhor padre, os meus cumprimentos republicanos, laicos e democráticos.
Carlos Esperança
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Comentários
Subject: Visita do PR ao Vaticano - reflexões
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Olá boa tarde.
Começo por me apresentar. Sou padre católico e vivo neste momento na Diocese do Porto. Li o vosso comunicado.
Ele fez-me reflectir e tentar perceber em que ponto é que aquele ato vos pode ter ofendido. Prezo e respeito a liberdade religiosa que me permite a mim ser o que sou. Gostava de ter feedback neste meu contacto pois gostaria de apresentar mais algumas questões que poderiam ser respondidas em dezenas de criticas, likes e "deslikes" do facebook. Não o quero fazer porque as questões inquietam-me a mim e considero que neste caso só por esta via poderei ficar mais esclarecido. Não pretendo fazer debate, nem mesmo contra-ataque. Creio que isso não é útil para ninguém. Preciso apenas de compreender um pouco mais. Deixo como exemplo uma das minhas questões: é possível um cidadão NEUTRALIZAR a sua identidade religiosa, sexual, cultural, politica, ideologica simplesmente porque assumiu uma função representativa de um povo? Pode o cidadão Marcelo ser neutro lá porque é presidente da república? O povo sabia que ele é católico e isso contou para o ato eleitoral. Não pode ser exigido a um cidadão que a partir da tomada de posse como presidente passe a ser assexuado, areligioso, apolitico, apartidário, etc.
Caso queiram ajudar-me nestas minhas dúvidas ficarei grato. Não pretendo que concordem comigo e assumo que discordo da vossa leitura mas gostava de fazer o esforço mental e intelectual de compreender a vossa argumentação que de momento me parece desenraizada da identidade humana, por isso gostaria de refletir mais.
Caso não queiram aceitar o desafio apenas peço que mo digam para não ficar à espera ou não ficar com a sensação que simplesmente ignoraram o meu pedido.
Fiquem bem
renato poças
estou inteiramente de acordo que o presidente da republica se abstenha de qualquer manifestação publica de religiosidade enquanto representar nesse momento o povo portugus..eu não sou crente nem acredito em nada dessas tretas do deus que não existe
de acordo ccm a posição da associação ateísta
os meus cum+rimentos
Luciano leal
Já o anterior me tinha envergonhado várias vezes.
É come se fossem dois presidentes católicos pelo preço de um..
Uma vergonha!
O Presidente da República enquanto representante de todos os portugueses tem a 'obrigação' de ter um comportamento laico porque é o único que defende a liberdade religiosa.
A visita do Sr. Presidente foi ao Estado do Vaticano. Não foi à 'Santa Sé'.
Ninguém precisa de papas para ser uma pessoa decente.