O Ocidente de novo em apuros…
A educação, doutrinação e eventual radicalização dos muçulmanos funcionou durante séculos nas madraças adstritas às mesquitas através de escritos (arabescos) e da leitura e interpretação do Corão feita por muftis.
Há cerca de uma dezena de anos ainda funcionava deste modo. Os esparsos incidentes que aconteceram foram sempre desvalorizados como sendo obra de fanáticos e marginais debaixo da afirmação de que o Islão era outra coisa. Isto é, uma religião de paz e misericórdia.
Entretanto, se passarmos ao lado da grande escola de difusão do fundamentalismo que é a Arábia saudita e olharmos para a sua doutrina wahabita (sunita), com quem o Ocidente aceitou contemporizar em troca dos dinheiros do petróleo, verificamos que sempre existiram diversos (graves) incidentes internacionais, entre eles, as 'guerras israelo-palestinas' (hoje 'esquecidas').
Os mais recentes e gravíssimos incidentes acirraram toda esta cascata de doutrinação islamita. Primeiro, o Afeganistão e as sucessivas intervenções da ex-URSS e depois dos EUA/NATO, que fizeram o mundo despertar para um novo grupo: os talibãs. Estes não são os adolescentes pouco cultos, semialfabetizados nos caracteres árabes, aprendizes acríticos dos versículos corânicos para poderem frequentar as mesquitas e aí orar, mas uma nova estirpe - os ‘estudantes’ (da teologia) do Islão - que rapidamente se transformaram em jihadistas e passam a adoptar a violência, a cultivar as guerras santas, a lançar fatwas, numa incessante e fratricida luta pela supremacia entre os ramos do islamismo (sunitas e xiitas).
Depois, nomeadamente com a globalização decorrente da queda do muro de Berlim, foram aparecendo em catadupa (para consolidação da prédica salafista) múltiplos pretextos capazes (e eficazes) de expandir o jihadismo. Nomeadamente, dois grandes acontecimentos geo-políticos recentes: a invasão do Iraque e as chamadas ‘primaveras árabes’.
A invasão do Iraque, pela maneira como foi conduzida e pela arrogância bélica induzida e subjacente, baseada em falsas premissas (armas de destruição massiva) e espúrios conceitos (instaurar a democracia) criou um novo ‘estilo’ de (re)acção – o jihadismo anti-ocidental. Um novo tipo de jihadismo que continua a beber na doutrina islâmica mas tem outro posicionamento estratégico já que não se confina às ‘Arábias’: nasce e vive (segregado) em território ocidental (europeu), substituiu as madraças pelas redes sociais, as adagas por Kalashnikovs e os camelos por jipes todo o terreno com metralhadoras na caixa.
O segundo grande golpe foram as chamadas ‘Primaveras Árabes’ que alimentam e fomentam hostilidades internas baseadas em nobres conceitos democráticos e anti-ditatoriais, derrubam tiranos mas são incapazes de conter o surgimento de uma nova vaga de países islâmicos dominados pelo fundamentalismo ou, ainda pior, como o que se verifica na Líbia, podem destruir um País e entregá-lo a sanguinários 'senhores da guerra'.
Tendo varrido quase todo o Norte de África islâmico, passando ao lado do Egipto onde só conseguiram substituir a velha ditadura militar por outra mais jovem, chegam à Síria, onde semeavam ventos e tempestades. Na Síria o jihadismo verificou estar entalado entre as velhas ambições otomanas, a força persa e os problemas curdos e jogou forte e feio no dilema interno: sunitas contra xiitas. O Ocidente resolveu permanecer calado e quedo, manietado pela pressão sunita oriunda do reino saudita e apostou na queda rápida do alauita (xiita) Bashar al Assad. Nem tudo correu bem – nomeadamente após a intervenção da Rússia - e a tempestade com o epicentro no Médio Oriente foi ganhando força regional e ‘continental’.
Hoje os ventos desta vaga de ‘jihadismo anti-ocidental’, cada vez mais informe, oculta e poderosa (bem financiada), varrem toda a Europa. Chegam a Bruxelas, como já chegaram a Londres, Madrid, Copenhaga, Paris, etc.
Quando se reflecte sobre este sucinto e esquemático transito político, histórico e regional temos a noção de que o problema é muito maior (difícil) mas por outro lado cresce todos os dias a convicção de que a solução ‘global’ não é implementando medidas securitárias que ponham a Europa – e os seus cidadãos - a ferro e fogo.
E o problema grave (humanitário) é que não havendo capacidade política - nem lideres capazes - de encontrar soluções globais (económicas, financeiras, sociais e até religiosas) possivelmente surgirão ‘soluções finais’ (de horrorosa memória) que já se desenham nos movimentos da ultra-direita nacionalista europeia, em franco crescimento e ebulição e têm eco na burlesca campanha que Donald Trump desenvolve nos EUA. Este o drama do Ocidente.
Comentários
Não sendo possível controlar a Turquia (por mais acordos que se tentem) sempre boicotados pela falsidade e duplicidade de Erdogan (mais interessado no problema curdo) a primeira atitude de força que a UE tem de tomar contra o Daesh é neutralizar a produção dos poços de petróleo de Mossul e as refinarias de Shaaar e Baiji.
Bater onde mais dói e donde vem o folego financeiro. Um território com a dimensão da Grã-Bretanha não se alimenta de doutrinas fanáticas. Quando faltar o 'pilim' vão existir novas saídas para esta crise.
Depois haverá outras medidas a tomar (fundamentalmente políticas) mas ignorando a primordial só estamos a aumentar o número de vítimas.
A história de 'não colocar as botas no terreno' não pode perdurar por mais tempo. Se assim for esse 'trauma histórico' vai assentar sobre um amontoado de vítimas.