Carta sobre a descolonização a fascistas empedernidos
Vocês sabem que toda a gente sabe que vocês sabem que não houve descolonizações pacíficas depois das guerras de libertação e do sangue vertido.
Vocês sabem que toda a gente sabe que vocês sabem que não há um único exemplo de sucesso, que não tenha apanhado pacíficos colonos no vendaval das convulsões e dos ataques, às vezes tribais e bárbaros, que deram início à luta pelo direito inalienável à autodeterminação dos povos.
Vocês sabem que toda a gente sabe que vocês sabem que a obstinação fascista de Salazar, e seus cúmplices, esteve na origem da tragédia anunciada e da inevitabilidade do desastre.
Eu estive lá, nessa guerra absurda e criminosa, enquanto a guerrilha se estendeu a outras regiões de Moçambique. Cheguei com a guerra em Cabo Delgado e Niassa e voltei com ela estendida à Zambézia e a saber que alastraria como mancha de óleo, do Rovuma a Lourenço Marques.
Vocês julgam que não me comovi com o regresso e o drama das famílias sobreviventes, com a chegada de quem tudo perdera, o habitat, os haveres, a segurança e as ilusões? E que não pensei nos que combateram do lado errado e lá ficaram entregues à vindicta dos que, tal como eles, queriam sobreviver num ambiente onde escasseavam a comida e as oportunidades?
Ignoro o motivo por que insistem em responsabilizar quem não foi criminoso e teimam ainda em branquear a ditadura opressora do povo português e dos povos coloniais. Um país com escassos recursos conseguiu integrar sem discriminações centenas de milhares de retornados numa epopeia de generosidade e inexcedível solidariedade, num momento grandioso da nossa História.
Mas há sempre quem olhe sem ver, quem fale sem pensar e dirija o ódio às vítimas em vez de visar os algozes. Há fascistas que não vergam e ódios que não cansam.
Caros fascistas, vocês sabem que toda a gente sabe que vocês sabem como circulam as ideias de quem não compreende a História e ambiciona aventuras totalitárias na ânsia de uma desforra que transmitem de geração em geração e que parece estar a acontecer sob os auspícios de muitos que nunca viram África.
A vossa rede capilar venosa transporta sangue salazarista até à veia cava, que o deposita na aurícula direita (só podia ser a direita). A oxigenação não se conclui como devia. Na circulação pulmonar não liberta o anidrido carbónico do ressentimento e mingua-lhe o oxigénio da democracia, em doses suficientes, antes de chegar ao ventrículo esquerdo (exatamente por ser esquerdo). É por isso que esse sangue bombeado para a aorta ainda leva produtos finais do metabolismo reacionário quando bombeado para as ramificações arteriais que atingem todas as partes do corpo, cego e surdo aos ventos da História. O oxigénio da democracia não vence a barreira hematoencefálica de um fascista.
Há um veneno que vos intoxica enquanto não se libertarem dos resquícios fascistas que empeçonham o país que é de todos.
Vocês sabem que toda a gente sabe que vocês sabem que não há um único exemplo de sucesso, que não tenha apanhado pacíficos colonos no vendaval das convulsões e dos ataques, às vezes tribais e bárbaros, que deram início à luta pelo direito inalienável à autodeterminação dos povos.
Vocês sabem que toda a gente sabe que vocês sabem que a obstinação fascista de Salazar, e seus cúmplices, esteve na origem da tragédia anunciada e da inevitabilidade do desastre.
Eu estive lá, nessa guerra absurda e criminosa, enquanto a guerrilha se estendeu a outras regiões de Moçambique. Cheguei com a guerra em Cabo Delgado e Niassa e voltei com ela estendida à Zambézia e a saber que alastraria como mancha de óleo, do Rovuma a Lourenço Marques.
Vocês julgam que não me comovi com o regresso e o drama das famílias sobreviventes, com a chegada de quem tudo perdera, o habitat, os haveres, a segurança e as ilusões? E que não pensei nos que combateram do lado errado e lá ficaram entregues à vindicta dos que, tal como eles, queriam sobreviver num ambiente onde escasseavam a comida e as oportunidades?
Ignoro o motivo por que insistem em responsabilizar quem não foi criminoso e teimam ainda em branquear a ditadura opressora do povo português e dos povos coloniais. Um país com escassos recursos conseguiu integrar sem discriminações centenas de milhares de retornados numa epopeia de generosidade e inexcedível solidariedade, num momento grandioso da nossa História.
Mas há sempre quem olhe sem ver, quem fale sem pensar e dirija o ódio às vítimas em vez de visar os algozes. Há fascistas que não vergam e ódios que não cansam.
Caros fascistas, vocês sabem que toda a gente sabe que vocês sabem como circulam as ideias de quem não compreende a História e ambiciona aventuras totalitárias na ânsia de uma desforra que transmitem de geração em geração e que parece estar a acontecer sob os auspícios de muitos que nunca viram África.
A vossa rede capilar venosa transporta sangue salazarista até à veia cava, que o deposita na aurícula direita (só podia ser a direita). A oxigenação não se conclui como devia. Na circulação pulmonar não liberta o anidrido carbónico do ressentimento e mingua-lhe o oxigénio da democracia, em doses suficientes, antes de chegar ao ventrículo esquerdo (exatamente por ser esquerdo). É por isso que esse sangue bombeado para a aorta ainda leva produtos finais do metabolismo reacionário quando bombeado para as ramificações arteriais que atingem todas as partes do corpo, cego e surdo aos ventos da História. O oxigénio da democracia não vence a barreira hematoencefálica de um fascista.
Há um veneno que vos intoxica enquanto não se libertarem dos resquícios fascistas que empeçonham o país que é de todos.
Comentários
Excelente texto.
Cumprimentos
MR
Este discurso é velho de mais e sem qualquer novidade.
Foi iniciado no dia 26 de Abril para calar aqueles que viriam a denunciar a irresponsabilidade como tudo inevitavelmente se viria a processar.
Chamar aos gritos de fascista, colonialista, ou salazarista a quem denuncia toda a histórica irresponsabilidade do que foi o "26 de Abril" é "falseador empedernido" da história.
O dia 25 foi fantástico, mas não é motivo para desculpar a "merda" que se seguiu ató hoje.
Eu também sou septuagenário mas do século XX e não da Idade Média.
Sem esquecer aquela muito usada que a desgraça actual ainda tem raízes na «noite fascista».
ass) Manuel Torres
todos os dias leio seus escritos e fico com inveja de não ter a sua capacidade para dizer ainda mais do que aquilo que voçe diz
aquele abraço e continue
Luciano leal