“Tem ‘pai’ que é cego”…
Alguns desenvolvimentos mais recentes da política portuguesa relativas ao nosso programa de ajustamento trouxeram-me à memória o humorista brasileiro Jô Soares que se ‘imortalizou’ com o memorável espectáculo ‘Viva o Gordo’ [*].
Jô, nesse programa semanal, para além de satirizar personagens marcantes da história como por exemplo (Sancho Pança, Balzac, etc.), da vida política e social brasileira sob uma farsa à volta de um caricato ‘reizinho’ (gordo), do ‘capitão Gay’, da (porno)sarcástica ‘Bô Francineide’, etc.,. Neste socorreu-se de um conjunto de ‘bordões’ que obtiveram um assinalável êxito na opinião pública entrando de imediato no léxico popular corrente.
Um destes ‘bordões’ foi o conhecidíssimo “tem pai que é cego”. Tratava-se do caricato Dorival que frequentava cursos 'pouco habituais' para o género ou se quisermos atípicos para a época (…estamos nos anos 80!) como maquilhagem, ballet, ‘lavores’, costura, etc., que o ‘pai de família’, orgulhosamente, relatava com sendo relevantes e másculas actividades e provocava nos auditores uma reacção que se popularizou: ‘Cala-te boca, tem pai que é cego!’
Bem, regressemos ao presente e à analogia. Quando um alto responsável político nacional olha para o actual governo e constata que este programa de ‘ajustamento’ que, no concreto, trouxe um empobrecimento generalizado do País, lançou centenas de milhares de portugueses no desemprego, espoliou milhões de portugueses de importantes fontes de rendimentos do trabalho, à custa de cortes salariais e ‘enormes’ impostos, rebentou com economia sob os escombros de uma espiral recessiva, etc., afirma que este programa não está a ser cumprido ‘cegamente’ [1] é caso para gritar: “Tem ‘pai’ que é cego”!
Concluindo: esta seria uma ‘boutade’ hilariante sobre o processo de 'ajustamento' em curso se não fosse tremendamente trágica ...
[*] – O título do programa humorístico inspirou-se numa peça de teatro ‘Viva o Gordo, Abaixo o Regime’ protagonizada por Jô Soares, em que ‘regime’ não significava qualquer tipo de dieta, mas a ditadura militar que – na época – fustigava e oprimia o povo brasileiro.
Comentários