União Civil Registada- um aborto jurídico
Excelente o post anterior do Luís Grave Rodrigues. É claro como água que esta proposta de lei do PSD foi feita às três pancadas para tentar armadilhar a discussão. A redacção desta proposta de lei é péssima, um mau exemplo de produção legislativa. Para além das incoerências oportunamente indicadas pelo Luís, há ainda outras:
- A que propósito é que aparece, no Artigo 2º, alínea b), o requisito de "residir legalmente há pelo menos dois anos em território nacional"? Qual é o critério para estabelecer estes dois anos? É que segundo a legislação referente ao regime de residência estabelece-se a equiparação de direitos dos estrangeiros residentes aos cidadãos nacionais e comunitários. Este requisito é manifestamente arbitrário.
- O Artigo 3º/2 estabelece que "os efeitos patrimoniais são livremente convencionados pelos parceiros de acordo com a sua vontade, nos limites da lei e no respeito pela ordem pública". Livremente convencionados pelos parceiros? Isto vai totalmente ao arrepio do direito da família português. "Nos limites da lei"? Qual lei? O regime das convenções ante-nupciais e dos regimes de bens previstos no Código Civil? E nos termos do Artigo 3º/5, o Conservador de Registo Civil é que vai ter que avaliar se o acordo está conforme a este cheque em branco?
-Segundo o Art. 4º/2, "quando só um dos parceiros detiver a nacionalidade portuguesa, o registo da união civil confere o direito à aquisição da nacionalidade pelo outro, nos termos da Lei da Nacionalidade, contando-se o prazo de três anos a partir da data do registo". Então significa isto que, se se alterar o prazo para aquisição da nacionalidade na respectiva Lei da Nacionalidade, teremos também que alterar esta lei, sob pena de contradições problemáticas... má técnica de produção legislativa.
-De bradar aos céus o que está previsto no Art. 5º/4, ao prever que "cada um dos parceiros tem o direito a pedir informações sobre o estado de saúde do outro". Para além de legislar acerca da união civil de homossexuais, visa ainda o PSD legislar sobre direito biomédico, enterrando décadas de doutrina, jurisprudência e convenções internacionais que hoje consagram o direito à informação sobre o seu estado de saúde como um direito eminente e estritamente pessoal do paciente, que só com o seu consentimento pode ser transmitido a outrem, seja cônjuge, parceiro, unido de facto ou familiar. Erro crasso!
-Finalmente, nos termos do Art. 9º/1 a), " a união civil registada dissolve-se por vontade unilateral de um dos parceiros notificado ao outro por qualquer das formas legalmente admitidas". Mas que estabilidade é que isto dá à União Civil Registada, se é mais fácil dissolvê-la do que denunciar um contrato de fidelização a uma rede de telemóveis?
Para além de ser redigida de forma desastrosa, com uma péssima técnica de produção legislativa (recomenda-se ao staff jurídico do PSD a aquisição de um bom manual de legística, por exemplo este), enfermando de erros jurídicos crassos, bem demonstra que a ideia do PSD não é a de criar um regime de casamento homossexual sem a palavra casamento (que é o peixe que tenta vender), mas outrossim acrescentar uma ou outra migalha aos direitos já conferidos aos unidos de facto, tentando torpedear a discussão, e assim agradar às suas clientelas ultramontanas.
- A que propósito é que aparece, no Artigo 2º, alínea b), o requisito de "residir legalmente há pelo menos dois anos em território nacional"? Qual é o critério para estabelecer estes dois anos? É que segundo a legislação referente ao regime de residência estabelece-se a equiparação de direitos dos estrangeiros residentes aos cidadãos nacionais e comunitários. Este requisito é manifestamente arbitrário.
- O Artigo 3º/2 estabelece que "os efeitos patrimoniais são livremente convencionados pelos parceiros de acordo com a sua vontade, nos limites da lei e no respeito pela ordem pública". Livremente convencionados pelos parceiros? Isto vai totalmente ao arrepio do direito da família português. "Nos limites da lei"? Qual lei? O regime das convenções ante-nupciais e dos regimes de bens previstos no Código Civil? E nos termos do Artigo 3º/5, o Conservador de Registo Civil é que vai ter que avaliar se o acordo está conforme a este cheque em branco?
-Segundo o Art. 4º/2, "quando só um dos parceiros detiver a nacionalidade portuguesa, o registo da união civil confere o direito à aquisição da nacionalidade pelo outro, nos termos da Lei da Nacionalidade, contando-se o prazo de três anos a partir da data do registo". Então significa isto que, se se alterar o prazo para aquisição da nacionalidade na respectiva Lei da Nacionalidade, teremos também que alterar esta lei, sob pena de contradições problemáticas... má técnica de produção legislativa.
-De bradar aos céus o que está previsto no Art. 5º/4, ao prever que "cada um dos parceiros tem o direito a pedir informações sobre o estado de saúde do outro". Para além de legislar acerca da união civil de homossexuais, visa ainda o PSD legislar sobre direito biomédico, enterrando décadas de doutrina, jurisprudência e convenções internacionais que hoje consagram o direito à informação sobre o seu estado de saúde como um direito eminente e estritamente pessoal do paciente, que só com o seu consentimento pode ser transmitido a outrem, seja cônjuge, parceiro, unido de facto ou familiar. Erro crasso!
-Finalmente, nos termos do Art. 9º/1 a), " a união civil registada dissolve-se por vontade unilateral de um dos parceiros notificado ao outro por qualquer das formas legalmente admitidas". Mas que estabilidade é que isto dá à União Civil Registada, se é mais fácil dissolvê-la do que denunciar um contrato de fidelização a uma rede de telemóveis?
Para além de ser redigida de forma desastrosa, com uma péssima técnica de produção legislativa (recomenda-se ao staff jurídico do PSD a aquisição de um bom manual de legística, por exemplo este), enfermando de erros jurídicos crassos, bem demonstra que a ideia do PSD não é a de criar um regime de casamento homossexual sem a palavra casamento (que é o peixe que tenta vender), mas outrossim acrescentar uma ou outra migalha aos direitos já conferidos aos unidos de facto, tentando torpedear a discussão, e assim agradar às suas clientelas ultramontanas.
Comentários
Cabe à Esquerda, defensora da nova Lei, não se deixar enredar nestas manobras.
De facto, a chicana política está em pleno desenvolvimento e vale tudo, inclusive, textos escritos em cima do joelho que lancem a confusão sobre o tema.
A Direita sustentada por conceitos (ou preconceitos) sociais de segregação das minorias, considera possível legitimar usando critérios enviesados de democracia directa ou formas mitigadas de condescendência parcial de prerrogativas, que mais não visam do que a opressão do Homem, nos seus direitos cívicos.
A insidiosa campanha desenvolvida à volta dos casamentos homossexuais não nos honra, nem nos enobrece na missão – que todos temos a obrigação de participar – de defender princípios de igualdade e dignidade da pessoa humana, que constam da maioria das proclamações universais de Direitos, Liberdades e Garantias e, igualmente, em muitas Constituições que regem as nações democráticas.
Estamos, portanto, com bons ou péssimos textos a abordar este problema, no mau caminho e enfrentando o risco de enveredarmos num vergonhoso retrocesso civilizacional.
Ao fim e ao cabo, se deixarmos vingar estas barreiras levantadas pelos conservadores, estaremos, em pleno século XXI, a meter a “cidadania no armário”, ou na gaveta, em nome de quê?
Da fé?
(Noção de casamento)
Casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições deste Código.
Não era mais fácil tirar aquela parte "de sexo diferente", para se atingir os fins que se pretende?
Isto é, considerar-se que duas pessoas podem casar, independentemente de ser um casal heterossexual ou homossexual, simplesmente porque o Estado nada tem a ver com as orientanções sexuais dos cidadãos??
Pode ser da hora, mas acho os dois projectos de lei aberrantes, quer o do PS que para mim estranhamente entre outras questões, obsta à adopção por parte dos casais homossexuais (preconceito encapotado! Casar sim, mas adoptar, calminha, coitadinhas das criancinhas que "isso" pega-se!!) . Quer a do PSD, que ainda assim considero intelectualmente mais honesta, (mas dimetralmente oposta à minha sensibilidade) pelo simples facto de não quererem que os homossexuais sejam casados. Querem que sejam outra coisa qualquer. Claro está que o projecto de lei do PSD além de aberrante, está mal concebido, por todas as razões já anteriormente esmiuçadas pelos bloguistas Rui Cascão e Luis Grave Rodrigues.