Árbitro à moda de Boliqueime

Com formação feita no Estado Novo e a carreira numa espécie de permanente azedume contra os partidos, Cavaco Silva foi o mais expedito exemplar do político antipolíticos. Bastou-lhe a rodagem de um carro novo, a cumplicidade dos jovens turcos do PSD e a omissão do seu passado, para chegar a líder partidário.

Depois foi o que se sabe e o que não se diz, a ocupação dos mais altos cargos do Estado e os negócios nos intervalos, os períodos em que se finge morto e as intermitências em que desembesta e mata, sempre com um olho em si próprio e outro no cigano, como soe dizer-se.

Depois de ter chumbado para árbitro num concurso com Jorge Sampaio, acabou por ser aprovado, por debilidade da concorrência, e reincidir no segundo mandato, com a mais exígua votação de sempre.

Foi aí que o homem revelou a grandeza da vingança com o raivoso discurso de vitória, a peixeirada com que promulgou o Estatuto dos Açores, o discurso do último 25 de Abril, a data que lhe altera o ph gástrico, até chegar à imprudência de deixar o País à deriva.

Incapaz de fazer o que devia, perante a morte prematura do seu Governo e o espetáculo público da desintegração pela via epistolar, entendeu o árbitro marcar um campeonato em que escolheu os clubes, convocou os jogadores e distribui-lhes os lugares, sem falar com o inepto a quem tinha dado posse, há dois anos, como capitão da equipe.

Insatisfeito com o lugar de treinador, o árbitro exigiu a um clube que ignorou, perseguiu e ostracizou, que servisse de massagista. Parece uma tarefa excessiva para quem não foi capaz de explicar um simples caso de escutas inventadas. Foi um pequeno passo na sua história de vida e uma grande caminhada para o abismo em que precipitou Portugal.

Comentários

e-pá! disse…
"Com formação feita no Estado Novo e a carreira numa espécie de permanente azedume contra os partidos, Cavaco Silva foi o mais expedito exemplar do político antipolíticos"...

Bem, muitos de nós (os > 60 anos denominados de 'seniores') fizeram a sua formação no Estado Novo. Não existiam muitas alternativas. Poucos dispunham de meios suficientes para fazê-la no estrangeiro, alguns tiveram de lutar para consegui-la por cá e muitos não acederam a qualquer tipo de formação (digna desse nome).
É por isso - mas não só - que passados 40 anos os 'cursos de formação' são ainda um bom negócio...
Um outro problema - para a minoria que conseguiu aceder a uma formação cá ou lá fora - foi a possibilidade do exercício profissional com dignidade e competencia.
A grande oportunidade no Estado Novo foi o 'carreirismo' que muitas vezes era um processo rebuscado cheio de meandros. O carreirismo (profissional) foi (e ainda será) uma das variantes do 'arrivismo', uma forma de êxito à sombra do 'oportunismo'.
Enfim, um conjunto de 'ismos' que estão por detrás de muitos percursos profissionais já que estes expedientes possibilitavam entreabrir de portas num País que (no Estado Novo) era para a Europa e para o Mundo um enorme gheto.
Cavaco Silva quando, em 1967, pelo seu punho, na ficha que preencheu na PIDE, por alegados 'motivos académicos', e onde essa sinistra organização questionava a sua posição e actividades políticas escreveu o seguinte - "integrado no actual regime político" - estava, aos 28 anos, a percorrer alguns dos caminhos atrás mencionados.
Hoje, extinta a PIDE, tudo seria diferente. Mas com grande probabilidade teria de passar através de um outro 'ismo': o 'jotismo'.
O que também não dispensa ficha.

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