‘Crónica de uma Morte Anunciada’…



O anúncio de ruptura das negociações à volta de um ‘compromisso de salvação nacionallink (para usar a terminologia do PR) agrava uma turbulenta fase política despoletada com a demissão do ministro Vítor Gaspar, acompanhada no dia seguinte pelo ‘irrevogável’ abandono de Paulo Portas, que deixaram o Governo sem pé.

A intervenção do Presidente da República nesta ‘grave crise’ (as palavras vieram de Belém) teve o condão de não clarificar a situação política. Antes pelo contrário, introduziram novos vectores de perturbação em todo este processo. Mau grado isso e dado que a comunicação do PR ao país no dia 10 de Julho continha, no seguimento de uma exaustiva preocupação justificativa para a não convocação de eleições antecipadas, uma proposta de compromisso entre os signatários do Plano de Assistência Económica e Financeira com vista a viabilizar um novo ciclo programa de Governo que fosse capaz de concluir esse Plano até 30 de Junho de 2014.

Hoje - e após a ruptura - foi possível conhecer as propostas que o PS link e o PSD link levaram a estas negociações. Por assim dizer a discussão chegou à rua.

Os documentos merecem um estudo sério e aturado porque contêm muitas vertentes mas é possível fazer um exercício rápido quanto a um dos 3 pilares que o PR delimitou para um possível compromisso. Trata-se da antecipação das eleições legislativas.

O PSD (pág. 8 do documento) condiciona a marcação de eleições a uma ‘data que não prejudique o pleno regresso ao financiamento de mercado’ e aperta de tal maneira o cerco à volta do OGE de 2015 que acaba por atirar as eleições lá para 2015 (o que praticamente as faz coincidir com o términos da actual legislatura). Isto é, ‘destrói’ o primeiro pilar do compromisso a conseguir.

O PS (pág. 3) insiste na fixação de um calendário rígido e defende a "antecipação da antecipação" das eleições propondo que as mesmas se realizem em simultâneo com as europeias (Maio de 2014). Justifica este passo com o calendário de apresentação e aprovação do Orçamento de Estado de 2015. Isto é, considera a realização de eleições uma emergência (partidária, estratégica e nacional).

Claro que estas 2 posições antagónicas revelam como o ‘compromisso de salvação nacional’ ao pretender protelar o óbvio – a resolução da actual crise política só se consegue através de nova consulta popular – acabou por, no meio destas conversações, secundarizar o instrumento político fundamental para a resolução da crise. É legitimo pensar que uma das partes não quis compreender que um ‘face lifting' governamental tão superficial e ‘cosmético’ pode satisfazer a maioria parlamentar mas não consegue remover as tremendas dificuldades geradas e acumuladas cá dentro (nomeadamente os rebates partidários) e terá enveredado por desbaratar muitas parcelas de idoneidade lá fora.

Embora os próximos dias sejam determinantes para a saída da crise que se agiganta,  ao Presidente da República pouco mais espaço restará do que convocar o Conselho de Estado e dar seguimento ao processo constitucional aplicável: a dissolução da AR e a convocação de eleições antecipadas.

Como na obra de Gabriel García Márquez (Crónica de uma Morte Anunciada) a fatalidade tem a capacidade de tornar inglórios e invisíveis os esforços para prevenir o inevitável…

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