O enigma de uma contrarrevolução silenciosa
Portugal tem o poder confiscado, não apenas pelos credores, por
gente sem rosto que pode estar a fazer chantagem sobre os órgãos de soberania.
O medo grassa ao ritmo da miséria, o desemprego em linha com a dívida e a
insanidade de alguns governantes ao sabor da medicação que se esquecem de
tomar.
Estamos em pleno processo de desmantelamento do Estado e de arresto
das funções por rostos anónimos e entidades desconhecidas. Há uma seita de retornados
ressentidos que se aliou a académicos experimentalistas para aplicarem, em
Portugal, a receita do Chile de Pinochet e apagarem a memória histórica do 5 de
Outubro e do 25 de Abril.
Tomaram conta dos partidos do poder e infiltraram-se na
própria oposição indivíduos de rudimentar alfabetização ou de passado pouco
recomendável. Chegaram ao Governo, ocuparam altos postos da administração
pública e decidiram leiloar o ensino, a saúde e a segurança social.
Cavaco não reúne o Conselho de Estado, enquanto o poder cai
na rua, o Estado desaba e as instituições não só deixaram de funcionar regularmente,
mas simplesmente deixaram de funcionar.
Prepara-se a agora a divisão dos despojos do Governo que sobrou,
sob os auspícios do ministro irrevogavelmente demissionário, por ser
politicamente insustentável, e que, só por dissimulação – segundo alegou –,
podia continuar.
Esse ex-ministro regressa para usurpar dissimuladamente as funções
de PM, sem que o país seja ouvido, nem sequer os deputados, na AR, se pronunciem,
nem, pelo menos, os Conselheiros de Estado serem chamados a aconselhar o PR e a
justificar a existência do órgão que integram.
Há seguramente, para além da troika, tríades que condicionam
um módico de decência no exercício do poder que resta e na liturgia que simula
a dignidade.
O sonho de Sá Carneiro tornou-se no pesadelo aterrador que
superou as suas ambições.
Temos um governo, ainda que não se saiba, um presidente,
conquanto não exerça, uma maioria, embora desavinda, e um patriarca que troca a
cabeça pelo barrete cardinalício, abjurando alegadas convicções para se tornar
assessor do Governo, com missa, hóstias, bênçãos, orações e sinais cabalísticos
a sublinhar as palmas da claque recrutada para a sua primeira missa nos
Jerónimos.
Só não sabemos o que nos espera no processo
contrarrevolucionário em curso.
Ponte Europa / Sorumbático
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