Justiça e dúvidas

O presidente do Eurojust, Lopes da Mota, será alvo de um processo disciplinar no âmbito do inquérito às alegadas pressões no «caso Freeport». Em causa, a possível violação do dever de isenção.

Apesar do pântano a que nos vamos habituando há um sobressalto cívico que a notícia desperta. De pouco vale a presunção de inocência quando o caldo da intriga e da luta partidária, feito de assassínios de carácter, já se encarregou de sugerir a presunção de culpabilidade .

São fáceis de imaginar os efeitos devastadores de notícias deste quilate na credibilidade dos agentes políticos e na desmotivação do eleitorado para participar nos actos eleitorais que se avizinham. Os projectos políticos não se confrontam, compara-se o carácter dos candidatos traçado pela intriga e pela calúnia. O país não quer aferir projectos, basta-lhe fruir escândalos e enxovalhar governantes com suspeitas de corrupção ou indignidade.

Não sei se é por masoquismo ou tendência suicidária dos portugueses que o País se vai transformando num lamaçal onde a difamação é um direito e o insulto um argumento.

A justiça, que já gozou de recato e prestígio, mesmo no tempo em que alguns juízes se prestaram para exercer funções nos Tribunais Plenários, vê-se agora desacreditada pela agenda política de dirigentes sindicais que não escondem o indisfarçável gozo com que atacam o poder executivo e o legislativo.

O País não esquece a conspiração contra Ferro Rodrigues, a impunidade de quem violou o segredo de justiça para destruir o líder do PS, a indulgência para quem cometeu erros grosseiros e a imagem sinistra do juiz que humilhou a Assembleia da República, onde foi prender um deputado, que nem sequer viria a ser acusado, levando a televisão atrás.

Na Casa Pia continuam, como se sabe, as violações de crianças, agora já sem interesse mediático. Já desapareceram dos telejornais a inefável D. Catalina e o inevitável Pedro Namora , a primeira certamente activa em devoções pias e o segundo em trânsito do PCP para o PPM em viagem autárquica.

Face à politização da justiça e à sua ineficácia, ampliadas por avençados partidários na comunicação social, quer sejam graves ou só caluniosas, as acusações contra os altos dirigentes, tornam irrelevantes os factos, dispensam a jurisprudência e o julgamento é feito pela populaça de acordo com as simpatias partidárias.

À crise financeira, económica, política e social veio juntar-se a deliquescência ética e o exotismo dos sindicatos de magistrados.
Ponte Europa / SORUMBÁTICO

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Esta crónica também está publicada no "Sorumbático", [aqui], blogue onde o autor é "contribuidor".
Com o seu acordo, promoveu-se um 'passatempo com prémio' que pode ser visto [aqui].
O teor dos comentários pode ser o mesmo dos afixados aqui no "Ponte Europa", mas só serão considerados, para efeitos de prémio, se forem, também, afixados no "Sorumbático".
O 1.º prémio (um exemplar do livro «Urdidura»)foi atribuído ao leitor Carlos Antunes.
Houve ainda mais dois premiados, que vão receber outros livros.

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