Eleições europeias e paradoxos
Os Estados-maiores partidários mobilizaram-se, este fim de semana, para tentarem retirar o País da apatia, do marasmo.
Anteciparam o arranque da campanha eleitoral para as europeias. Ontem foi um dia de grande movimentação política contra o previsível grande vencedor destas eleições: a abstenção.
Há 30 anos que se disputam eleições para o Parlamento de Estrasburgo.
Ao longo destes anos, essencialmente desde 1979, o Parlamento Europeu (PE), ganhou novas atribuições e foram-lhe atribuídos novos poderes. Contudo, apesar destas alterações, a participação eleitoral dos cidadãos europeus continua em queda.
Neste momento, temos a sensação que tudo está em “queda”…livre.
A justificação comum é que estas eleições derivam para questões nacionais e desviando-se dos objectivos centrais, desmobilizam, tornam-se politicamente irrelevantes e perdem eleitores.
Mas o problema poderá ser mais profundo. É pertinente interrogarmo-nos:
- Há uma opinião pública europeia?
- Existe uma política de comunicação e intercâmbio na Europa?
- Promoveu-se algum diálogo civilizacional ou intercultural no seio da UE?
Neste momento, não conheço nenhum suporte material para responder a estas questões, excepto o “Eurobarómetro” e a esmorecida realização que se dá pelo nome de “capital europeia da Cultura”.
De resto, em relação ao espaço europeu, há um profundo divórcio dos portugueses.
Prementes situações como a inflação, o desemprego e a situação económica, ocupam o cerne das preocupações dos portugueses e são o denominador comum dos cidadãos europeus.
Mais de metade dos portugueses, neste momento, avaliam a integração europeia como um situação globalmente positiva e como um factor que equilibrou e beneficiou o País.
A “lentidão” da integração europeia faz com que só 29% dos portugueses inquiridos pelo “Eurobarómetro” considerem que “as coisas na Europa vão na direcção certa”.
Esta descrença será o motivo determinante do divórcio do povo português nas instituições europeias.
As campanhas eleitorais europeias não veiculam mensagens claras, nem explicitam um rumo definido. Embora, o PE tenha sido acrescido de novos poderes, continua sem capacidade democrática de nomear o “governo da UE”, i. e., a Comissão Europeia, que é acordada nos bastidores. É esta “intensa” política de bastidores que retira toda a capacidade de mobilização para a participação eleitoral. O mote é: “Não vale a pena, já está tudo arranjadinho!”.
Depois, existindo 2 grandes famílias políticas europeias (o PPE e o PSE), as diferenças programáticas e de actuação parlamentar são praticamente indistinguíveis. Como se apela no cartaz, a escolha, sendo do cidadão, leva-o a questionar qual o “peso” dessa opção no futuro das instituições europeias?
Fala-se, ao de leve, no Tratado de Lisboa, cujo bloqueio se prolonga no tempo. E, abdicamos que o referendar por múltiplas razões. Uma delas por ser urgente a sua aplicação.
Por outro lado, o Tratado de Lisboa foi politicamente ultrapassado pela crise que, quer nas eleições europeias, quer em quaisquer outras que ocorram neste tempos, em 2009-2010, modelará o contexto e o sentido do debate.
Os temas candentes europeus serão a regulação dos mercados, as políticas de coesão, as leis sobre emigração, a questão ecológica enfim, a construção da EUROPA SOCIAL. Mas, não vale a pena alimentar ilusões. A centralidade dos debates vai incidir sobre a crise económica e social de cada País. E o sentido do voto caminhará inexoravelmente para a tentação de “punir” os Governos em exercício. Não há volta a dar-lhe. É assim nas eleições para o PE, como também nos referendos.
Por outro lado, esta complexa situação de crise tripartida (financeira, económica e social) abre as portas a que surjam, em Estrasburgo, todo o tipo de radicalismos, extremismos e programas excêntricos de que são exemplos a extrema-direita nacionalista e anti-europeia com a exploração do medo, partidos que preconizam uma “solução final” para os ciganos (Partido Operário checo), a entrega do “Ocidente em mãos cristãs” (Partido das Liberdades austríaco), etc.
A visão de nova Europa construida sobre valores civilizacionais, culturalmente activa e criadora, economicamente desenvolvida, justa e socialmente solidária, mantém-se ainda muito longínqua, distante e indefinida.
A visão de nova Europa construida sobre valores civilizacionais, culturalmente activa e criadora, economicamente desenvolvida, justa e socialmente solidária, mantém-se ainda muito longínqua, distante e indefinida.
É uma realidade fátua, ausente e sem contornos que não chegou a muitos dos cidadãos da UE, nem sequer conseguiu impregnar a consciência política de muitos dos eleitos para a representar em Estrasburgo. São extremamente frequentes no PE acordos entre os eurodeputados do tipo “bairrista” (para a dimensão da Europa). Por exemplo, num assunto que diz respeito a Portugal, os eurodeputados portugueses votam em bloco e solidariamente, independentemente dos partidos a que pertencem. Isto pode parecer muito bonito em Lisboa mas não têm nada a ver com o espírito europeu. Na verdade, para além destas piruetas nacionalistas, estou convicto que nas cadeiras do PE em Estrasburgo sentam-se muitos eurocépticos e as actuais eleições podem fortalecer esta retrógrada componente anti-europeia.
Esta falta de clarificação do destino da Europa leva ao total desinteresse dos povos – os novos membros da UE são ainda mais absentistas – pelas eleições europeias.
A "lógica política doméstica" leva a que as Oposições tentem “castigar” o Governo. Os militantes do partido que suportam a acção governativa, pelo seu lado, acorrem na defesa da situação nacional. É esta “diversão política” que anima um pouco a campanha eleitoral, mas pouco ultrapassa a limitação das "militâncias". Em todo o caso se estas "escaramuças" não tivessem lugar o "desastre da abstenção" poderia, ainda, ser ainda maior. Assim, este acto eleitoral que deveria, no seu somatório, ser a resultante da expressão política europeia, nunca o será, vítima das citadas adulterações das finalidades deste acto cívico e de cidadania, que influenciam um posicionamento errático dos (reduzidos) eleitores e, o mais grave, incorrem no sério risco de desviar a UE para uma perigosa alienação.
Estas eleições em lugar de contribuírem para a construção europeia serão, antes de tudo, dominadas por Mundo em crise e, na Europa, condicionadas por demasiados comportamentos políticos paradoxais.
Todavia, nesta encruzilhada do percurso político europeu, não há alternativa diferente da do apelo à participação.
Esta falta de clarificação do destino da Europa leva ao total desinteresse dos povos – os novos membros da UE são ainda mais absentistas – pelas eleições europeias.
A "lógica política doméstica" leva a que as Oposições tentem “castigar” o Governo. Os militantes do partido que suportam a acção governativa, pelo seu lado, acorrem na defesa da situação nacional. É esta “diversão política” que anima um pouco a campanha eleitoral, mas pouco ultrapassa a limitação das "militâncias". Em todo o caso se estas "escaramuças" não tivessem lugar o "desastre da abstenção" poderia, ainda, ser ainda maior. Assim, este acto eleitoral que deveria, no seu somatório, ser a resultante da expressão política europeia, nunca o será, vítima das citadas adulterações das finalidades deste acto cívico e de cidadania, que influenciam um posicionamento errático dos (reduzidos) eleitores e, o mais grave, incorrem no sério risco de desviar a UE para uma perigosa alienação.
Estas eleições em lugar de contribuírem para a construção europeia serão, antes de tudo, dominadas por Mundo em crise e, na Europa, condicionadas por demasiados comportamentos políticos paradoxais.
Todavia, nesta encruzilhada do percurso político europeu, não há alternativa diferente da do apelo à participação.
Comentários
falta à europa "political appeal". para medir o interesse destas eleições talvez valha a pena perguntar: que pensarão os chineses disto?