Código de Processo Penal

E se, em vez de ...

... gritar contra uma lei que diminui os prazos de prisão preventiva (mas também os aumenta depois de haver condenação confirmada...), racionaliza as escutas telefónicas, reduz o segredo de justiça e impõe maior celeridade no processo penal, entre outras mudanças virtuosas, nos rebelássemos contra a demora e a ineficácia na investigação e na acusação penal e, em geral, em todo o processo penal?

[Publicado por Vital Moreira] 19.9.07

Comentários

e-pá! disse…
"racionaliza as escutas telefónicas...".

Embora, ao que parece (não sou jurista), não conste no novo Cógdigo, não foi ventilada a hipótese do o SIS efectuar escutas telefónicas?
Pelo menos a Imprensa referiu isso.

Se assim for, com o devido respeito a Vital Moreira, estaremos num caminho avesso a qualquer racionalidade.
Iremos a caminho de um intolerável e inadmissível atropelo às liberdades individuais.

De resto, quanto às considerações gerais, nomeadamente, sobre a "demora e a ineficácia na investigação e na acusação penal", penso que todo o País está de acordo.
Não podemos, no entanto, cercear a liberdade de comentar ou criticar (criticar pode não ser gritar) o trabalho produzido pelas instituições democráticas, incluindo um Parlamento, eleito pelo Povo.
Uma das particularidades do regime democrático é a não existencia de "vacas sagradas" (como na India).
Anónimo disse…
Sr. Prof., EU NÃO "GRITO"; falo porque detesto impôr-me.
Sou assumidamente limitado e, assim, porque acho que o novo C.P.P. que deu saída já a ... "135" muito presumivelmente delinquentes, e/ou outros a cumprir já (pesadas) penas, não tem nada a ver com algo que desejamos mais justo, penso eu.
Os "sábios" que asseguraram a negociação e a garantia para esta Lei que continuem por favor a negociar/assegurar, a efectiva segurança da sociedade Portuguesa.
Anónimo disse…
VM no seu melhor...
Tenha juízo, Senhor Professor!!!
Anónimo disse…
DAS VERDADEIRAS INTOXICAÇÕES E MENTIRAS

1. Sempre que, ciclicamente, se discute o processo penal na comunicação social, é repetido à exaustão por alguns membros da classe política, alguns ilustres advogados e ainda alguns professores de direito que existem demasiados presos preventivos em Portugal.
À força de tanta repetição, tal AFIRMAÇÃO veio a transformar-se em “FACTO”.
Nos últimos dias, esse foi novamente um dos argumentos utilizados para justificar a redução dos prazos da prisão preventiva.
Segundo os dados mais recentes do International Centre for Prison Studies, do prestigiado King’s College London, facilmente consultáveis no mapa que se encontra nesta página, a percentagem de presos preventivos (em relação ao número total de presos) existente em Portugal é das melhores dos países ocidentais.
Os menores valores situam-se nos 16 e 17%, sendo os casos do Reino Unido (16,1%), Rússia (16,5%, embora este tenha um ratio de 628 presos por 100.000 habitantes) e Alemanha (17,4%). Entre os 19 e os 23% situam-se alguns países, como a Noruega (19,8%), os EUA (21,2%, embora tenha um ratio de 750 presos por 100.000 habitantes!), a Austrália (21,6%), a Suécia (22,2%), Portugal (22,7%), a Espanha e a Áustria (ambas com 23.2%). Abaixo dos 30% está ainda a Dinamarca (27%). Acima dos 30% encontram-se a Grécia (30,3%), a França e o Canadá (31,5%), a Bélgica (37,2%) e a Suiça (39,1%). Os valores mais altos são os da Itália (57,1%) e os da Turquia (61,5%).
A análise destes números impõe uma óbvia conclusão: os números portugueses são bons. Poucos países há em melhor situação que Portugal.
Merece, ainda, destaque o facto de, como é sabido, em muitos dos países mencionados apenas ser contado como de prisão preventiva o tempo que decorre até à decisão em primeira instância. Se tal critério fosse o adoptado em Portugal, e não é, a nossa percentagem de presos preventivos seria de 16,9%, ou seja, dos melhores do mundo!
O “FACTO” é afinal apenas um lamentável e perpétuo “MITO”, alimentado ao longo de muitos anos por aqueles a quem convém. Podemos chamá-lo até de “MITO JUDICIÁRIO”.
A utilização deste argumento como justificação da redução das situações em que pode ser aplicada a medida de coacção de prisão preventiva e redução dos prazos da mesma assenta deste modo numa mentira e é uma verdadeira intoxicação da opinião pública.

2. Um outro argumento utilizado neste debate e com o mesmo objectivo é o de que são muitos e muitos os casos em que pessoas sujeitas a prisão preventiva vêm a ser ilibadas em julgamento.
Desconhece-se em que estudos científicos ou estatísticos assenta tal afirmação. Uma coisa é certa: a experiência de todos os magistrados é a de que tais situações são absolutamente raras e, quando infelizmente sucedem, tal deve-se a alguns formalismos da lei processual penal ainda existentes e incompreensíveis para qualquer português, mesmo não jurista, como o de que a confissão do arguido perante o juiz de instrução, na presença do seu advogado e do Ministério Público, pode não ter qualquer valor em julgamento.
Também este argumento pretende assim contaminar a apreciação que os portugueses vêm fazendo sobre este novo Código de Processo Penal.

3. Outro aspecto que se subentende no discurso daqueles que defendem que este era o momento e a forma de proceder às descritas alterações da lei processual penal é o de que os magistrados são os culpados da demora processual.
Esta é mais uma frase feita, um outro “mito judiciário”.
Quem o diz ou pensa desconhece o tempo que o Instituto Nacional de Medicina Legal demora (devido aos escassos meios que tem) para realizar uma autópsia médico-legal que necessite de complementares exames toxicológicos ou outros, uma perícia psiquiátrica ou um exame de comparação de ADN, desconhece o tempo que o Laboratório de Polícia Científica demora (também devido aos escassos meios que tem) para realizar uma perícia de balística ou biológica, desconhece o tempo necessário para uma perícia contabilística-financeira. Ou talvez conheça e finja que não. Quem o conhece sabe que não será possível manter os arguidos em prisão preventiva até à conclusão dos inquéritos com esses exames periciais: os novos prazos são inferiores ao tempo que hoje normalmente demoram tais exames.

4. Esta campanha de intoxicação da opinião pública pretende esconder um facto:
Estas alterações não afectam de modo algum o trabalho dos magistrados. Estes aplicam facilmente qualquer lei e fazem-no sempre de forma séria e responsável. Ao contrário de outros, não ganham nem mais nem menos por prender ou libertar pessoas.
Não é, pois, sobre eles que irão recair os efeitos nefastos deste novo Código.
Tal irá suceder para com todos os portugueses que não os 2778 que se encontravam em prisão preventiva às 24h00 do passado dia 14 de Setembro, especialmente aqueles que foram vítimas dos crimes praticados por esses indivíduos, aqueles mais fracos e desprotegidos, aqueles que não têm acesso a segurança privada e motorista, aqueles que andam de transportes públicos.
Dizem que “os arguidos não devem pagar pelo facto de o Estado não ter mais meios”. Talvez não. Mas devem ser os restantes cidadãos, aqueles que nada de mal fizeram e por isso não são arguidos e não se encontram em prisão preventiva a pagar esta “factura social”? Devem ser estes a sofrer as consequências da libertação prematura de indivíduos perigosos? Devem ser estes a sofrer as consequências da impossibilidade de êxito das investigações à criminalidade económico-financeira, à organizada e à transnacional, crimes que minam os próprios fundamentos do Estado de Direito democrático?
Se os magistrados vêm indicando as consequências deste novo Código de Processo Penal não é por qualquer “tique corporativo de classe”. É porque, conhecendo-as, é sua responsabilidade, até social, alertar todos os portugueses que representam.

Retirado de http://www.smmp.pt/news.asp?idM=162&lng=1&ref=172&lyt=5
Carim Vali disse…
Exactamente. O problema aqui é a lentidão da justiça, e não uma lei que, entre outras coisas, vem limitar um instrumento que leva à prisão de cidadãos não condenados e portanto inocentes até prova em contrário.
Claro que aqueles que preferem a segurança às liberdades civis, o Estado autoritário à democracia, a obediência ao livre arbítrio, olham para uma lei que reduz o tempo e o alcance da prisão preventiva e a associam imediata e primariamente à complacência para com o crime e à libertação de marginais e criminosos.

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